Sinuca de bico

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Sinuca de bico: Sob impulso de pequenas empresas, pedidos de recuperação judicial aumentam 38% em junho

“Tendência é piorar, pois a população está descapitalizada”, avalia Creso Suerdieck, especialista em recuperações judiciais

(Foto: Tânia Rêgo – Agência Brasil)

Os dados de pedidos de recuperação judicial referentes a junho começam a ter os efeitos da pandemia do coronavírus. De acordo com levantamento mensal feito pela Serasa Experian, o total de pedidos de proteção contra a falência no mês passado aumentou 38%, na comparação com maio.

O número foi influenciado pelo aumento dos pedidos feitos por pequenas empresas, que têm menos poder de negociação com credores e menos fluxo de caixa. Foram 97 solicitações em junho, 79% a mais que em maio e 5,4% superior ao registrado no mesmo período de 2019.

Creso Suerdieck DouradoPara Creso Suerdieck, especialista em recuperações judiciais, a tendência é a piora destes números. “Os empresários estão começando a abrir seus estabelecimentos, nesta retomada gradual, e já estão percebendo que os cidadãos estão descapitalizados”, observa.

Inadimplência

No acumulado do ano, os pedidos de recuperação judicial caíram 2,8%. Já os pedidos de falência caíram tanto na comparação mensal (25%) quanto no semestre (33%).

“A inadimplência sobe em qualquer crise, e nesta não será diferente. O que não aconteceu em recessões anteriores é esse esforço governamental em liberar crédito e a disposição de credores em negociar, o que evitou temporariamente uma explosão de inadimplência”, diz Luiz Rabi, economista-chefe do Serasa Experian.

A tendência, segundo ele, ainda tem sido a renegociação de dívidas com empresas que estejam com dificuldades conjunturais de caixa durante a pandemia.

“Os menores têm muito menos fôlego e precisam recorrer mais rapidamente à ajuda. Quase nunca têm condições de negociar com os credores também. Os números mostram que são esses segmentos que têm sentido primeiro os impactos da pandemia”, afirma Paulo Campana, sócio do escritório Veirano.

Mesmo com a alta de pedidos de recuperação judicial por empresas menores, ainda é pequeno o índice de negócios desse porte que recorrem ao Judiciário.

“Dada a burocracia, muitos microempresários simplesmente baixam as portas dos negócios para evitar arcar com custos de fechar uma empresa, por exemplo”, diz Rabi.

Fechando as portas

“Numa crise como esta, o número de empresas que fecham as portas é muito maior que o número de falências ou de recuperações judiciais, dificilmente um microempresário ou MEI (microempreendedor individual) recorre ao Judiciário”, diz Flávio Calife, economista da Boa Vista SCPC.

“Micro e pequenas empresas são 98% dos CNPJs no país, mas representam cerca de 20% dos processos de recuperação judicial brasileiros. O Judiciário não estaria nem preparado para receber pedidos desses segmentos”, afirma Marcelo Guedes Nunes, professor de direito da PUC-SP e presidente da Associação Brasileira de Jurimetria.

Nunes diz que as recessões de fato aumentam o número de processos de recuperação judicial, mas que esse efeito só costuma ser observado com atrasos entre 90 e 120 dias.

“O empresário sente o impacto da crise no caixa primeiro, fica inadimplente, busca negociação com credores e só depois contrata um escritório de advocacia para buscar uma recuperação judicial”, diz ele.

A expectativa, segundo ele, é que o volume de processos de recuperação judicial aumente mais que o de falências.

“Empresas com passivos inferiores a R$ 100 milhões têm tido dificuldade de acesso a crédito e de renegociar diretamente com bancos suas dívidas de maneira efetiva”, diz Juliana Bumachar, sócia do escritório que leva seu sobrenome.

“A tendência é de aumento dos casos a partir de setembro, porque a maioria das recuperações judiciais deferidas hoje é de empresas que estavam em dificuldades antes da pandemia”, diz ela.

“Os principais efeitos da recessão sobre os processos de insolvência ainda não chegaram. Setores como varejo, turismo e transportes foram muito afetados e precisarão passar por reestruturação, mas nem sequer sabemos ainda a magnitude do estrago”, afirma Campana.

Segundo Juliana, há ainda expectativa quanto à mudança na lei de falências brasileira. Há dois projetos de lei em discussão avançada no Congresso – um com medidas emergenciais e outro estrutural.

“O projeto emergencial foi aprovado pela Câmara, mas ainda não está na pauta do Senado. É possível que chegue tarde para muitas empresas”, conclui.

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